A educomunicação é um campo de convergência não só da comunicação e da educação, mas de todas as áreas das ciências humanas. Essa idéia foi apresentada pelo professor Ismar de Oliveira Soares, da ECA/USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo), durante o Seminário Educação e Comunicação: um debate contemporâneo, promovido pela FEUSP (Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo) e pelo mestrado em Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi, realizado entre os dias 6 e 8 de novembro, nos campi das duas instituições. Junto com Oliveira Soares, compondo a mesa-redonda “Educação na comunicação: uma questão de ética”, participaram também Maria da Graça Jacinto Setton, da FEUSP, e Paulo Vasconcelos, da Universidade Anhembi Morumbi.
A participação de Ismar de Oliveira Soares iniciou-se com a apresentação de um vídeo sobre a Fundação Casa Grande, uma espécie de centro cultural freqüentado por crianças e jovens da cidade de Nova Olinda (CE), e onde o conceito de educomunicação está sendo desenvolvido. O texto do vídeo fala que as crianças participam brincando, tomam decisões até para manter o funcionamento da organização não-governamental, que visa resgatar a história e a cultura do povo sertanejo. Segundo o vídeo, Casa Grande tem 16 diretores, entre 10 e 18 anos, responsáveis por um orçamento de R$ 1.200,00. Mesmo com o pouco dinheiro, conseguem manter uma rádio e uma televisão comunitária.
Após a apresentação do vídeo, Oliveira Soares abordou o conceito de educomunicação. Ele disse que a ECA/USP está investigando o assunto, que surgiu de realidades existentes desde os anos de 1950. O professor da ECA entende que muitas pessoas decidiram intervir na sociedade para reconstruí-la e que a defesa do meio ambiente, nesse sentido, virou uma norma, envolvendo empresas, indivíduos e sociedade. “Isso foi alcançado graças a um grande esforço produzido de forma alternativa até atingir a grande mídia, com a participação de comunicadores, educadores e de pessoas das mais diversas áreas, que se juntaram e passaram a trabalhar com referenciais teóricos e metodológicos de várias áreas das ciências humanas e acabaram constituindo um movimento social em torno da cidadania, da democracia e em torno da luta para quebrar a hegemonia dos sistemas estabelecidos”, esclareceu Oliveira Soares, salientando que o conceito de educomunicação surgiu nesse contexto. “Não, portanto, como fruto de reflexões de grandes teóricos e grandes filósofos, mas a partir de uma prática de cidadania”.
Segundo Oliveira Soares, a universidade olha para as experiências com o objetivo de sistematizá-las. “Uma pesquisa realizada na ECA, nos últimos anos, ao identificar a seqüência dessas experiências e sua natureza, acabou mudando a emergência de um campo que não é exatamente o da educação tradicional nem o da comunicação, porém seria um campo de convergência, não só dessas duas áreas, comunicação e educação, mas de todas as áreas das ciências humanas; e que tem na busca da cidadania e da participação a sua força”, explicou, frisando também que é um campo frente ao qual há resistências. “A educação tradicional olha para essa área como algo que, às vezes, pode estar ameaçando a sua ortodoxia; e a comunicação olha para esse campo como algo pobre, algo de gente que não está no mercado”.
Apesar das resistências, Oliveira Soares ressaltou que a educomunicação vai ganhando força de uma “forma incontrolável” junto aos sistemas tradicionais. Um exemplo pode ser verificado, segundo o professor, com o programa educom.rádio, que está envolvendo cerca de 110 pessoas trabalhando com 30 escolas. O objetivo é de discutir o conceito de educomunicação, com questões teóricas e, especialmente, práticas. Uma abordagem possível é verificar “como através de um meio de comunicação (no caso o rádio, mas pode ser outro veículo) a comunidade escolar passa a discutir o seu ecossistema comunicativo e como ele poderia estar sendo gerenciado”.
Ismar de Oliveira Soares, que é responsável pela supervisão geral do projeto, estima atingir cerca de 455 escolas do município, formando mais de 9 mil educomunicadores no final do projeto. “O grande objetivo é que os educadores e as crianças, juntos, se perguntem quais são os coeficientes comunicacionais de nossas ações e como podemos transformar o nosso espaço em espaço de vida”, explicou.
Dentro de algumas observações sobre o tema, Oliveira Soares e a equipe que integra o projeto entendem que educomunicação é “um campo de implementação de políticas de comunicação educativa, tendo como objetivo geral o planejamento, a criação e o desenvolvimento de ecossistemas educativos mediados por processos de comunicação e pelo uso das tecnologias da informação”. Seus objetivos específicos, segundo Ismar de Oliveira Soares, são: promover o acesso democrático dos cidadãos à produção e difusão da informação; identificar como o mundo é editado nos meios; facilitar o processo ensino-aprendizado através do uso criativo dos meios de comunicação (entra tecnologias, vista a partir não da tecnologia em si, mas de suas características e da importância de ter acesso a eles); promover a expressão comunicativa dos membros da comunidade educativa.
Para ilustrar esses horizontes, o professor da ECA leu algumas linhas escritas por uma criança que participa do projeto educom.rádio:
Quero uma escola que eu realmente me encontre, em que eu realmente me ache. Eu quero ter em uma escola a possibilidade dos meus auges serem totalmente alcançados. É o que eu quero da minha escola. Desejo nela dar respeito que admiro, ser respeitado por todos e ainda mais quero olhar para os meus professores e admirá-los assim como alguns eu já admiro. Neles, eu e todos os verdadeiros alunos nos espelhamos acima do meu respeito e admiração pelo carinho que sinto de forma igual como sou tratado. Desejo uma escola que, na verdade, eu me identifique e que eu tenha direito de falar e realmente de ser escutado. Quero uma escola que me ajude a encontrar o caminho certo e que me permita opinar no que acho que está errado.