Como o trabalho em grupo está sendo utilizado em salas de aula? De que maneira os professores de matemática vêem essa prática e quais conhecimentos teóricos são aplicados? Essas e outras questões nortearam a dissertação de mestrado de Diana Olinda Cabrera Zúñiga. Seu estudo procurou examinar a aprendizagem cooperativa no ensino da matemática, concentrando-se na relação existente entre o docente e essa técnica. Segundo a pesquisadora, os professores não estão utilizando-a de forma adequada.
A dissertação de Zúñiga parte de um questionamento derivado da sua experiência como aluna da faculdade de Educação da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Peru e como professora de matemática do 2o Grau (ensino médio) em diferentes séries. Tal questionamento suscitou as seguintes perguntas: “Estamos utilizando da melhor forma a técnica da aprendizagem cooperativa?”; “Esgotamos seus recursos?”. Após a pesquisa e suas reflexões, segundo a pesquisadora, concluiu-se que a resposta é não. A partir dessa constatação, surgiu a idéia de investigar as práticas de professores de matemática que estejam utilizando tal técnica.
Segundo Zúñiga, o objetivo do estudo é aprofundar a discussão sobre a aprendizagem cooperativa na Educação Matemática, buscando contribuir para a contínua valorização do trabalho de grupo (base dessa forma de aprendizagem), a partir da perspectiva da Dinâmica de Grupo. O trabalho concentra-se na relação entre o professor de matemática e a aprendizagem cooperativa. Tal relação é analisada como parte integrante do “saber docente” indicado por Tardiff (1991).
Para Tardiff, diz a pesquisadora, o saber docente é um saber plural oriundo de diversas fontes, no qual destacam-se: os saberes da formação profissional (das ciências da educação e da ideologia pedagógica transmitidas pelas instituições formadoras); os saberes das disciplinas (dos diversos campos do conhecimento, sistematizados nas universidades); os saberes curriculares (discursos, objetivos , conteúdos e métodos da instituição escolar); e os saberes da experiência (desenvolvidos pelo professor no exercício de sua profissão).
O fim expresso da pesquisa é revalorizar o trabalho em equipe, com a finalidade de proporcionar à comunidade de educadores matemáticos brasileiros e peruanos novos elementos de análise das práticas docentes no tocante ao trabalho em grupo. Espera-se, diz Zúñiga, que o estudo realizado seja útil para as instituições e organismos peruanos e/ou brasileiros engajados na formação permanente de professores de matemática.
Segundo a pesquisadora, o eixo do trabalho centrou-se no seguinte pressuposto: o estudo da relação entre professores de matemática e trabalho em grupo pode fornecer elementos que levem à questionar e refletir sobre o uso da técnica do trabalho em grupo por professores que lecionam esta ciência nas escolas. Tal pressuposto poderia levar a desvelar situações de proximidade ou distanciamento com o que se diz na literatura especializada sobre a Dinâmica de Grupo e a Aprendizagem Cooperativa.
Tendo por base esse pressuposto e os objetivos estabelecidos, algumas perguntas orientaram o desenvolvimento da pesquisa. Entre elas: Quais são os fundamentos da Dinâmica de Grupo?; Na definição de Aprendizagem Cooperativa utilizada atualmente dentro da Educação Matemática, existem elementos comuns com a definição do Trabalho de Grupo proposto na Teoria da Dinâmica de Grupo?; Como é que os professores de matemática incorporam a técnica do trabalho em grupo em suas aulas?
Como na Educação Matemática idéias sobre o trabalho em grupo vêm servindo de suporte para estudos sobre aprendizagem cooperativa, principalmente por educadores matemáticos americanos — e também alguns brasileiros —, Zúñiga desenvolveu na sua dissertação o que se diz a respeito dessa forma de trabalho no campo da educação, de forma geral, e na educação matemática, em particular. Além disso, segundo ela, incorporou-se algumas idéias de Piaget e de Vygotsky convergentes às da aprendizagem cooperativa.
O estudo teve como referente algumas definições. Entre elas, a definição da “aprendizagem cooperativa” de Artzt & Newman (1993). Tais autoras definem o trabalho em grupo que envolve um problema, uma tarefa e uma meta em comum como aprendizagem cooperativa. Segundo elas, a aprendizagem cooperativa requer que os membros do grupo percebam que são parte de uma equipe com objetivo comun. Eles têm que estar conscientes de que qualquer problema que resolvam será patrimônio do grupo e que o sucesso ou o fracasso terá que ser compartilhado por todos os membros da equipe.
A Dinâmica dos Grupos é outra definição que está na concepção não tradicional da educação onde o aprender tem a conotação de atividade, isto é, busca e criação do saber, e não simplesmente repetição. Aprender, sob esta concepção, é resolver problemas e não repetir o que dizem os livros ou o mestre. A capacidade de repetir algo não garante o entendimento. Sob a concepção não tradicional, a aula é vida e considera a energia, a força moderadora do grupo, além do desenvolvimento das capacidades para atuar eficientemente em grupos.
Com respeito às idéias de Piaget e Vygotsky, segundo Zúñiga, resgatou-se várias delas. Uma foi a idéia sobre o valor da dimensão social da comunicação. Para Piaget, o processo de socialização do pensamento nas crianças é fundamental. Tal processo, segundo o autor, é favorecido mais pelas trocas entre elas do que com seus professores. (Piaget, 1967, Cf. 192).
Vygotsky (1998), entretanto, diz Zúñiga, coloca que o “aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida intelectual daqueles que as cercam” (p.115). Além disso, o mesmo autor diz que saber comunicar-se é importante para transmitir, receber e relacionar idéias. Mais ainda, comunicação e pensamento são inseparáveis. A relação entre idéias, por meio do uso da linguagem, torna possível interiorizar ou questionar padrões de comportamento fornecidos pelo grupo cultural, sintetizar, organizar idéias e, consequentemente, resolver dificuldades e problemas.
Para desenvolver o trabalho de pesquisa, Zúñiga partiu do conhecimento de que em algumas escolas do Rio de Janeiro os professores de matemática utilizam em suas aulas o trabalho em grupo. Realizou-se, então, um trabalho de investigação exploratória sobre os conhecimentos e a prática que os docentes têm em relação ao trabalho em grupo. Levantou-se, então, a opinião deles no tocante à aprendizagem cooperativa e à forma de utilizar esta técnica na sala de aula.
Segundo Zúñiga, utilizou-se o método qualitativo de pesquisa e fez-se entrevistas semi-estruturadas. Também houve breves observações nas salas de aula de matemática destas professoras. Essas informações foram integradas com os dados da literatura especializada.
Com base no estudo teórico e prático descritos, analisados e integrados, chegou-se às seguintes conclusões:
a) Os fundamentos teóricos da Dinâmica dos Grupos estão inseridos no contexto de uma educação não tradicional. A partir dessa visão, na Educação Matemática, tem surgido diversos movimentos que apontam à renovação do ensino da matemática, visando mudar o modelo pedagógico tradicional da matemática-produto.
b) A discussão sobre os fundamentos da Dinâmica de Grupo, tema abordado nas décadas 50 e 60, é retomado na presente década por educadores matemáticos. É importan
te que o professor organize o meio ambiente ou o conjunto de experiências que possibilitem o crescimento de seus alunos. É importante que o professor, através dessa organização, possibilite o desenvolvimento de diversas capacidades, como por exemplo: capacidade crítica, capacidade para resolver problemas, espírito de colaboração, de criatividade, e de comunicação.
c) As informações fornecidas pelas professoras em relação ao trabalho em grupo foram significativas, embora não sustentem com a base teórica correspondente. Percebeu-se o esforço delas para que seus alunos trabalhassem em equipe e, mesmo na ausência dessa base teórica, as professoras conseguiam que a maior parte de seus alunos atingissem com os objetivos propostos nas tarefas.
d) Pode-se inferir, das entrevistas, que as professoras tinham noções sobre o que “deveriam de fazer”, e até indicaram estar identificadas com o Trabalho em Grupo. Essas noções, embora não estivessem sustentadas em um estudo da Dinâmica dos Grupos, tinham semelhanças com os procedimentos que figuram na literatura sobre o tema.
e) Nenhuma das professoras manifestou conhecer ou ter ouvido falar sobre a aprendizagem cooperativa. Tal estratégia, a qual não foi identificada pelas professoras com o trabalho em grupo, deveria ser mais divulgada. Assim deveria se promover a participação de professores em estudos que tratem o tema da aprendizagem cooperativa em diversos contextos sociais, para que eles possam ter elementos de analise de suas próprias práticas no tocante à utilização da técnica do trabalho em Grupo.
f) Com relação às tarefas selecionadas pelas professoras para serem realizadas em grupo, percebeu-se que a maior parte delas poderia ter sido resolvida individualmente.
g) Considerou-se no trabalho que a aprendizagem cooperativa, no Brasil, merece uma atenção mais consciente por parte de educadores e pesquisadores. Existem de fato tentativas dignas de considerar (tanto de estudos feitos por pesquisadores quanto de experiências levadas a cabo por professores de escolas) que chamam à continuação dos estudos nessa área. “Os professores de matemática frente à Aprendizagem Cooperativa”, dissertação de mestrado de Diana Olinda Cabrera Zúñiga. Orientação: Paola Sztanj. Defesa em novembro de 1999, no departamento de Educação da PUC-RIO.