Contexto de mercado competitivo; novas relações entre oferta e procura; qualidade total; direitos básicos de cidadania e outros temas relevantes da sociedade contemporânea. Nesta realidade, como entender a relação entre educação e trabalho e as novas demandas das transformações políticas, econômicas, sociais e culturais? Essas mudanças estão presentes na escola? De que forma? Considerando as relações sociais neste espaço coletivo de aprendizagem, quais abordagens teóricas e práticas tratam dessas circunstâncias e de que maneira, tendo em vista a formação do trabalhador?
Procurando responder a essas questões, professores, pesquisadores e alunos do Programa de Pós-Graduação em Educação: História, Política e Sociedade da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) desenvolveram um conjunto de estudos e pesquisas; e com as reflexões obtidas realizaram um seminário, envolvendo outros participantes, em agosto de 1998. Uma coletânea de oito comunicações apresentadas pode ser conferida no livro Trabalho, Formação e Currículo: para onde vai a escola?, organizado por Celso J. Ferreti e João dos Reis Silva Jr., ambos professores pesquisadores da PUC-SP, e por Maria Rita N. S. Oliveira, professora titular da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Os textos têm como objetivo a superação das contradições entre a educação orientada pelos valores do mercado e a voltada para uma democracia social e econômica. “Todos os autores abordam a realidade da escola, discutindo, mais particularmente, a propósito, quer o caráter formador/deformador das práticas, relações sociais e concepções em seu interior, quer os regimes de verdades vigentes nos currículos escolares, quer ainda, as determinações econômicas e políticas que a informam”, antecipa a apresentação dos organizadores.
A sociedade não globalizou apenas mercados, mas vivências, situações, políticas e decisões que afetam nossas vidas, valores e condutas, afirma o professor Miguel G. Arroyo, titular da Faculdade de Educação da UFMG, no primeiro texto do livro, cujo título ficou “As relações sociais na escola e a formação do trabalhador”. Segundo ele, numa visão mais totalizante dos processos formadores, “teremos de incluir outros “educadores” e “socializadores” além da escola e da fábrica”.
Propondo um diálogo com a psicanálise e outros interlocutores, a professora Eloisa Helena Santos, da UFMG, aborda o tema do sujeito nas relações sociais e formativas, partindo de um olhar sobre os aspectos de um microuniverso que se articulam num cenário mais amplo. Santos baseia-se, para o estudo, numa experiência de introdução de tecnologias informáticas nos cursos de pedagogia e licenciatura da Faculdade de Educação da UFMG. Embora não haja dados conclusivos, pois segundo a professora os resultados ainda estão sendo analisados, o texto apresenta vários elementos para discussão, passando pela subjetividade, objetividade e pela relação com o saber.
A professora Lucíola Licínio de C. P. Santos, da UFMG, analisa as verdades vigentes nos currículos escolares, partindo de uma crítica às visões otimistas e negativas com relação à ciência. A primeira percepção vê no desenvolvimento científico e tecnológico a solução dos problemas ligados à pobreza e à falta de acesso ao conhecimento. A segunda, observa, simplesmente, um mundo com pessoas elegantes sem espaço para velhos e crianças. “De certa forma, estas duas posições compartilham um mesmo problema, ou seja, ambas terminam por simplificar a realidade em torno de determinadas polarizações, deixando de analisar as contradições e ambigüidades presentes no mundo social, bem como as diferentes gradações e formas segundo as quais os problemas se manifestam, tornando a realidade tão complexa”, alerta a professora.
Fazendo uma crítica à era do capitalismo neoliberal, o professor Tomaz Tadeu da Silva, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, examina os crescentes nexos entre educação e suas funções puramente econômicas. “A educação é redefinida como uma mercadoria cuja produção deve atender às precisas especificações de seu usuário final: a empresa capitalista”, salienta.
Na mesma linha, o professor Vitor Henrique Paro, titular da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo), reflete sobre as conseqüências da gestão escolar orientada por valores liberais, além de apresentar algumas perspectivas. A professora Maria de Fátima Félix Rosar, da Faculdade Federal do Maranhão, também fala sobre gestão escolar abordando a globalização da economia, a redução dos Estados nacionais e outras transformações mundiais.
“Em lugar da criação de ilhas de excelência, de um modelo de educação realizado pela implementação dos mecanismos diversos de privatização, seria direcionado o sistema educacional e a organização escolar para realizar uma democratização plena da educação destinada à emancipação humana dos cidadão”, conclui Rosar, quando propõe um resgate das experiências de projetos educacionais, resultantes do debate público e do acúmulo da contribuição dos especialistas.
As professoras Acácia Zeneida Kuenzer, titular da Universidade Federal do Paraná, e Sílvia Llomovatte, titular da Universidade de Buenos Aires, encerram a coletânea discutindo, respectivamente, as reformas educacionais no Brasil e na Argentina. Para Kuenzer, que se concentrou nas mudanças do ensino técnico desde 1909, com a criação de 19 escolas de artes e ofícios, até o governo de Fernando Henrique Cardoso, “o descompromisso com a universalização da educação em todos os níveis integra-se à política de destruição do sistema de produção de ciência e tecnologia, como convém a um país que abdica do direito de ser soberano e de participar autonomamente do processo de internacionalização do capital”.
Livro: Trabalho, Formação e Currículo: para onde vai a escola? Autor(es): vários. Organização de Celso João Ferretti, João dos Reis Silva Júnior e Maria Rita N. Sales Oliveira Editora: Xamã Páginas: 167 |