O agir pedagógico na pós-modernidade

O mundo contemporâneo vive um estado de transição, caracterizado por crises, rupturas e desordens. Novo contexto social para uma reflexão mais atenta, principalmente, na área educacional, sobre o agir pedagógico. Estamos construindo uma sociedade de riquezas e desenvolvimento, paralela à de pobreza e exclusão. Sem dúvida, um desafio a ser enfrentado por professores, famílias, assistentes sociais, responsáveis pela educação e políticos. Uma proposta para auxiliar a pensar essa situação pode ser conferida no livro A educação pós-moderna, dos pesquisadores Jean-Pierre Pourtois e Huguette Desmet, editado pela Loyola. O trabalho examina o ato educativo por meio de um conjunto de dimensões de ordem afetiva, cognitiva, social e ética.

Deve-se educar para emancipar ou para integrar socialmente os indivíduos? Para a conquista da própria liberdade ou para uma ação pertinente ao grupo social a que pertence? O livro, que faz referência a estudos e pesquisas realizados na família e no espaço escolar, caminha por essas interrogações, questionando-as, edificando uma visão complexa sobre os problemas pedagógicos, para se harmonizar com a sociedade e suas incongruências. A organização social, fundada em novas bases, exige adaptação, mobilidade e flexibilidade. Pensar a educação, atualmente, segundo os autores, é um trabalho de confronto e síntese de desafios psicológicos, culturais, econômicos, sociais e simbólicos.

O livro foi estruturado em quatro partes. A primeira apresenta algumas características que marcaram a modernidade e aponta as mudanças de perspectiva em decorrência da pós-modernidade. O texto contrasta modelos e critérios próprios da modernidade com um mundo em constante mutação, que exalta a mudança, promove a perda de sentidos e certezas pela falta de referências. Tem por objetivo abandonar o olhar moderno para superar as contradições existentes.

Para os autores, a racionalidade e a intensa produção de conhecimentos são características marcantes da modernidade. A primeira triunfou na ciência, na vida social, na educação, na justiça, na economia e em outros campos. Separou o mundo objetivo, criado e mantido pela razão, do mundo da subjetividade, centrado na pessoa. Nesse sentido, salientam os autores, a educação seria uma disciplina que liberta o indivíduo da visão estreita e irracional imposta pela família e suas paixões. “Portanto, a escola é lugar de ruptura com o meio de origem para alcançar o progresso. As crianças não passam de alunos, e o mestre é um mediador entre elas e os valores universais da verdade, do bem e do belo”, concluem. E mais, para eles, o período moderno declara a morte do sujeito.

A produção de saberes, segunda característica da modernidade indicada no livro, teve grande apoio dos meios de comunicação que também proliferaram pelo globo. “Essa multiplicação dos saberes em todos os sentidos corre o risco de criar um processo de excesso de sentido e, então, de perda de significação, conforme muito bem assinalou a Escola de Chicago”, alertam, explicando que a pluridisciplinaridade, nas suas disciplinas, correntes e teorias excluem-se mutuamente. Completam: “A sociedade, assim, também é fragmentada, pois a personalidade, a cultura, a economia e a política parecem caminhar cada uma em direção diferente”. Essa percepção é acompanhada de outra: a de que nenhum princípio unificador ou novo modelo mais complexo parece estar surgindo. Apesar disso, eles concordam que a sociedade atual está tomando consciência das contradições que a perpassam.

O livro caminha no sentido de interrogar sobre a possibilidade de construir um universo social, cultural, pedagógico, coerente e integrador, que acolheria ao mesmo tempo a razão e o ser, a racionalização e a subjetivação. “O universo pós-moderno será inelutavelmente complexo. Verá a perda do sentimento de certeza, reconhecerá o caráter instável de todo conhecimento; estabelecerá mediações entre os fatos contraditórios; ao mesmo tempo que continuará a fazer descobertas, integrará saberes; não rejeitará os progressos do período moderno, mas os articulará”, asseguram. A escola moderna é vista pelos pesquisadores como um espaço de orientação positivista, com aprendizagem do pensamento racional, resistência à noção de desejo e de prazer, rejeição da imaginação, horários rígidos e repartidos, alinhamento das carteiras etc. Em vários momentos do texto, os autores enfatizam que não se trata de privilegiar uma ou outra dimensão, subjetividade ou objetividade, mas de promover o diálogo entre elas.

A segunda parte do livro apresenta o paradigma psicopedagógico das doze necessidades, que procura explicar como o indivíduo constrói sua identidade no decurso de sua socialização e personalização, numa relação dialética de desenvolvimento e crise. Nesse momento da obra, os autores introduzem noções complexas e importantes para os termos necessidade e identidade. O objetivo é precisar a significação dos conceitos atribuídos no livro.

O paradigma foi elaborado no Ceris (Centre de Recherche e d”Innovation en Sociopédagogie familiale et scolaire) que tem por finalidade o estabelecimento de referências na educação das crianças. Pais, professores e pesquisadores encontram no Ceris um quadro de conjunto dos diversos componentes psicopedagógicos indispensáveis às necessidades da criança. O paradigma comporta quatro dimensões: afetiva, cognitiva, social e de valores. A cada uma das quatro correspondem três necessidades específicas da criança que, por sua vez, ligam-se a categorias de atitudes nos pais. Para os autores, o paradigma pode servir de quadro teórico que permite explicar e compreender o desenvolvimento do homem, além de servir como instrumento de formação dos adultos.

Essa parte do livro desenvolve teoricamente, com base na literatura científica, os diversos componentes do paradigma, mas também integra uma série de exemplos, mediante testemunhos de pais e de crianças, que concretizam a proposta teórica. O desenvolvimento da identidade, explicam os pesquisadores, é uma busca de laços (eixo afetivo: filiação), de sentido (eixo cognitivo: realização), de poder (eixo social: autonomia) e de valores (eixo dos valores: ideologia).

Identificar e analisar diferentes práticas pedagógicas para atingir o desenvolvimento ideal do sujeito é o objetivo da terceira parte do livro. O texto propõe a compreensão de que para cada necessidade mencionada no paradigma implica um agir pedagógico particular. São verificadas nove pedagogias. Nessa parte, o engajamento dos educadores também é tratado. Procura-se responder qual modelo educativo e como deve ser executado. O foco vai para os diversos agentes educacionais e, para tanto, os autores utilizam a noção de pedagogia da impregnação. Esse conceito é central para essa parte do livro pois questiona uma crença popular que entende pais, mães e membros da sociedade como seres dotados de capacidade inata para educar. A meta é investigar a origem dessa convicção.

Na última parte do livro, os autores fazem uma conclusão breve e panorâmica. Dizem, por exemplo, que as ciências da educação devem, atualmente, constituir-se no plural, falando muitas línguas, da psicologia, da sociologia, da psicologia social etc. Ou seja, utilizar conceitos e modelos dessas ciências. “A exclusão não é mais admissível no contexto educativo atual. Toda nossa herança anterior de conhecimento pode e deve servir”, lembram.


Livro: A educação pós-moderna
Autor(es): Jean-Pierre Pourtois e Huguette Desmet
. Tradução de Yvone Maria de Campos Teixeira da Silva
Editora: Loyola
Páginas: 312
COMO CITAR ESTE CONTEÚDO:
MENEZES, E. T. O agir pedagógico na pós-modernidade. EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 2000. Disponível em <https://educabrasil.com.br/o-agir-pedagogico-na-pos-modernidade/>. Acesso em 27 jul. 2024.

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